Em 2008 ainda mal se falava em Realidade Aumentada. Todavia, em terras lusas, surgia a IT People Innovation, um projecto visionário e arriscado mas que, chegados a 2017, é pioneiro, inovador, com cartas dadas e de uma qualidade estrondosa.
Durante o 4.º RALI – Realidade Aumentada em Lisboa, na Microsoft Portugal, a 4gnews conheceu esta empresa nacional. Agora, estivemos à conversa com o seu Founder and CEO, Eduardo Vieitas, e trazemos-te, na íntegra, a entrevista com o homem forte da Realidade Aumentada em Portugal.
Desde o seu nascimento, ao modelo de negócio desta empresa, da sua estratégia de mercado, do seu posicionamento, passando por alguns projectos já feitos e até às perspectivas futuras, tudo foi abordado.
Quase 100 pessoas, das quais 30 estão a trabalhar directamente nos projectos, inclusive na área da inovação, compõem esta orquestra tecnológica sediada em Alvalade, na cidade das sete colinas.
Esta empresa espelha o que de melhor se faz neste país e deixa qualquer um orgulhoso. Áreas como turismo, educação, saúde, arquitectura, eventos e até mesmo o retalho estão mais ricas graças à Realidade Aumentada e ao trabalho inovador da IT People. Não percas a entrevista abaixo.
Entrevista com Eduardo Vieitas (Founder and CEO) da IT People
Quando e como surge a IT People?
«A IT People surge em 2008. Quando criei a empresa o foco era a inovação. Em 2008 poucas pessoas sabiam o que era a Realidade Aumentada. E, para haver inovação, tem de haver investimento. Ora, investimento estamos a falar de um investimento grande e para isso ou são opções de capital próprio, banca ou outro. Porém, a nossa ligação à Realidade Aumentada só acontece em 2010.»
Em termos de valores investidos em quanto estamos a falar e como é que atraem investimento?
«Neste momento estamos a falar já de uns largos milhões de euros, dois milhões aproximadamente, investidos nestas áreas. No fundo o que nós temos é uma área de projectos e outsourcing que é o que nos permite investir. Ganhamos dinheiro no outsourcing com os projectos e depois investimos na vertente de inovação. Temos também protocolos muito fortes com as universidades. Temos aqui uma solução bastante interessante com o meio académico e o meio profissional. Fazemos um match entre esses dois meios. Juntamos os dois mundos e temos, assim, soluções que nos podem diferenciar no mercado nacional e até internacional.»
Esses protocolos são apenas com universidades nacionais ou internacionais também?
«Neste momento só estabelecimentos de ensino nacionais.»
Bolas de cristal ninguém as tem, é certo. A não ser as bruxas. Já a visão de mercado é um dom que não falta ao CEO da IT People. Eduardo Vieitas conseguiu perceber, em 2010, quando ainda tínhamos frozen yogurts e um ou outro gingerbread nos smartphones Android, que o futuro era a Realidade Aumentada.
Porque é que o Eduardo decidiu, em 2010, investir na Realidade Aumentada e como é que conseguiu ter toda esta visão de que o futuro passava por aí?
«Não se consegue ter essa visão. Isto, no fundo, às vezes é um pouco de carolice. Reparem que o tema da Realidade Aumentada, aliás, muitas vezes o tema da própria inovação parte por se começar a pensar em algo que não exista e a dificuldade é que podemos estar a apostar num cavalo que na realidade nunca virá a ser o cavalo certo. Felizmente não foi o nosso caso quando, em 2010, olhámos para a Realidade Aumentada. E, como se vê hoje em dia, a Google, o Facebook, a Microsoft, a Apple e por aí fora também decidiram que era esse o caminho.»
Uma das primeiras aplicações para Realidade Aumentada estava ainda nos antigos Nokias com o sistema operativo Symbian. Porém, na altura, isso acabou por morrer. O que é que aconteceu?
«O problema, muitas das vezes, é quando se apresentam aplicações cedo demais. Por exemplo, hoje toda a gente tem internet no smartphone e a Realidade Aumentada precisa de ter uma boa câmara no equipamento. Todavia, aqui há 10 anos atrás, as câmaras dos telefones eram o que eram e nós quando fazemos o reconhecimento de imagem temos de fazê-lo bem feito. As câmaras de hoje permitem isso; há 10 anos era impensável. Era muito interessante e muito giro mas, de facto, era muito caro, a internet era cara, os telefones eram caros e nem todas as pessoas tinham um smartphone. Hoje temos as condições ideais. Porém nós, em 2010, quando olhámos para isto achámos que já tínhamos condições suficientes para avançar.»
Com a chegada do Pokémon Go, em 2016, a massificação da Realidade Aumentada veio solidificar a presença e o peso da IT People no sector. O ano passado foi um ano de viragem para a Realidade Aumentada. Inclusive com o lançamento do primeiro smartphone com o Project Tango, da Lenovo.
O ano passado aparece o Pokémon Go. Como é que isso se viveu na IT People?
«Foi muito bom para nós. Quando apareceu o Pokémon Go de repente toda a gente passou a conhecer a Realidade Aumentada.»
Foi o grande boom da Realidade Aumentada e o início da sua massificação?
«Sim, foi. No fundo foi um processo de evangelização que para nós foi muito útil porque veio ajudar-nos a evangelizar a Realidade Aumentada. Também o lançamento dos HoloLens foi um marco. A Microsoft após lançar os HoloLens e o conceito de mix reality, efectivamente, provocou uma grande adesão e grande interesse do mercado, ou curiosidade.»
Os HoloLens tornaram-se numa grande ferramenta para a IT People?
«Sem dúvida que sim. Nós somos a empresa com mais experiência no desenvolvimento de soluções de Realidade Aumentada. Com os HoloLens fomos, inclusive, a primeira empresa portuguesa a criar uma solução com Realidade Aumentada, que foi a nossa ARchitect, para a store dos HoloLens.»
A nível de desafios fale-nos de um grande desafio tecnológico que já tenham tido.
«Um dos grandes desafios que nós já tivemos foi produzir Realidade Aumentada para BlackBerry. BlackBerry era um mundo muito fechado, mas conseguimos, conseguimos fazer, conseguimos contornar todo o processo. Na altura tínhamos um cliente, os CTT (que ainda é nosso cliente hoje), que usava muito BlackBerry. Eles precisavam de ter uma solução de Realidade Aumentada e nós conseguimos contornar.»
E qual foi o maior desafio?
«Tivemos vários desafios tecnológicos? Com certeza que sim. Mas o maior desafio foi o desafio do mercado. Ou seja, o mercado encontrar o momento para adopção da tecnologia.»
A forma como Eduardo Vieitas aborda o mercado é absolutamente irrepreensível. O modelo de negócio da IT People é sustentável e está organizado de uma forma totalmente pensada ao milímetro.
Como está organizada no mercado a vossa plataforma?
«A nossa plataforma chama-se Next Reality. A partir do momento em que nós temos uma plataforma o que nós fazemos é quase como começar a colocar peças de lego: as chamadas verticais. Por exemplo, a nível de aplicações, na área do imobiliário temos a ARchitect, na área da educação e da formação temos a EducAR, na área do retalho e dos catálogos temos o 4D Paper, na área dos eventos temos a EventAR e, para a área do turismo e museus, temos a VisitAR que é a nossa app mais galardoada, digamos assim. Tudo isto são as tais verticais que vão compondo a nossa plataforma.»
Qual a vantagem de terem produtos verticalizados?
«Ora, a vantagem aqui é que quando nós temos produtos verticalizados conseguimos falar com clientes verticalizados também. No entanto, o nosso modelo, é algo mais próximo de agências digitais, agências de publicação. Isto permite que os nossos clientes percebam que podem chegar também aos clientes deles através deste modelo vertical ou com a plataforma na qual podem criar qualquer outro vertical.»
Qual é o limite desta plataforma e deste modelo?
«Não há limite. Há apenas a questão da criatividade! Ou seja, nós temos um modelo de parceria, que está activo, em que tentamos identificar um parceiro local, que tipicamente conhece o mercado e tem o seu networking todo, para ele também poder promover as soluções de Realidade Aumentada, com verticais ou sem verticais, para o seu mercado.»
Presentes nas duas principais plataformas mobile (iOS e Android) a IT People não descarta a hipótese de desenvolver para Windows Mobile, se bem que esse não é o seu principal foco.
Neste momento está a haver um declínio do Windows Mobile. A IT People desenvolve para a plataforma Windows Mobile?
«Só quando o cliente faz muita questão. O que, normalmente, nunca acontece. Desenvolvemos, fundamentalmente, para iOS, Android e para os HoloLens. Embora tenhamos soluções desenvolvidas também para Windows Mobile. E somos, também, parceiros da Samsung e da EPSON.»
Eduardo Vieitas conhece bem o sector tecnológico e, ao contrário de muitos executivos nacionais, tem os pés bem assentes na terra. Se há coisa que a IT People não faz é dar passos maiores que a perna. A IT People é uma empresa que está cá pela inovação e cumpre aquilo a que se propõe.
A IT People esteve na Web Summit 2016, correcto?
«Sim, nós estivemos lá, de facto, com o stand da NOS onde fomos apresentar um novo projecto de Realidade Aumentada em televisão. Projecto esse onde é possível ver televisão sem ter uma televisão. Apresentamos lá um conceito de um estádio de futebol onde é possível ir ao estádio sem estar na bancada. Isto é, temos o estádio em 3D em cima da nossa mesa, escolhemos o lugar a partir do qual queremos ver o jogo e a partir daí aceder às estatísticas do jogo, jogadores e por aí fora.»
Qual foi o feedback da vossa presença na Web Summit?
«O stand teve permanentemente filas de espera entre 40 a 50 minutos. Esteve permanentemente cheio e tinha lá os HoloLens. Aliás, a apresentadora Filomena Cautela esteve lá a fazer uma reportagem e dizia, em graça, que o único stand que valia a pena visitar era o nosso, pois era o único que tinha ali inovação, de facto.»
Como é que se pode pôr as crianças e jovens a tirar partido desta tecnologia de uma forma didáctica?
«Através de processos de aprendizagem. Aliás, nós temos um produto que é o EducAR que é uma solução em que é possível aprender recorrendo à nossa memória visual. Por exemplo, normalmente numa escola primária ou secundária temos os estudantes a ver um livro sobre vulcões onde estão lá as informações todas (se estão activos, extintos, etc…). Porém, nós podemos fazer com que os miúdos apontem o smartphone para a página do vulcão e vejam o vulcão a sair em 3D, com movimento, cor, som e a informação sobre o mesmo. A partir daí até pode haver um quiz. A memória visual é muito mais forte nos processos de aprendizagem e isso funciona bem.»
O mercado mais refinado também tem aqui voz. O que é fascinante na IT People é a sua capacidade de chegar a todos. Desde uma criança no ensino básico, passando por um museu no interior do nosso país que quer tornar as suas visitas mais interactivas, até a um excêntrico milionário que quer navegar pelo projecto da sua mansão enquanto dá dicas aos seus arquitectos.
Existe, actualmente, tecnologia que possibilite que uma pessoa coloque os HoloLens e consiga visualizar o projecto da sua casa feito por um arquitecto?
«Correctíssimo. Mas isso é um complemento ao que tem sido feito até aqui. Aliás essa situação até pode ser concretizada de duas formas distintas. Numa, o cliente pode apontar o smartphone para a planta da casa e ver a casa a aparecer em 3D no seu equipamento; noutra o cliente pode recorrer aos HoloLens e na escala de 1:1 conseguir entrar na casa, abrir a porta, abrir o armário, acender a luz, abrir a janela. São duas experiências completamente diferentes.»
Qual é o target deste tipo de experiências?
«Esse tipo de experiência, tipicamente, está associado às experiências premium e aos produtos premium. Isto é, não se fará isso para um apartamento T1 que custa €60.000 ou €70.000. Não é essa a ideia. A ideia é: se nós queremos proporcionar uma experiência premium para um produto que também é premium faz sentido apostar numa solução premium.»
Têm algum projecto na área da saúde no qual estejam a trabalhar?
«Temos. Temos aqui um projecto já em curso, mas é um projecto que ainda não podemos divulgar. Nós acreditamos que 2018 nos vai trazer novidades nessa área. Aliás, num evento que decorreu no MEO Arena sobre saúde, no qual fui orador a convite da Microsoft, falei precisamente sobre a tecnologia da Realidade Aumentada direccionada para a área da saúde.»
Nota receptividade por parte desse sector a soluções de Realidade Aumentada? Nomeadamente os médicos, tendo em conta alguma carga bastante conservadora ainda presente na classe.
«Começa sempre por curiosidade, depois receptividade e depois adopção. Aliás, exemplo disso são as receitas médicas que há uns anos eram feitas a papel e caneta e, actualmente, são elaboradas através de um sistema informático. Na altura notou-se uma resistência gigante ao processo por parte dos médicos. Porém, hoje todos nós reconhecemos que foi uma das grandes medidas e faz todo o sentido. Neste caso, da Realidade Aumentada, penso que não vai haver resistência por parte dos médicos, pelo contrário, vai haver curiosidade que poderá levar à adopção da tecnologia. Mas, lá está, mais uma vez não se pede que os médicos abandonem as suas técnicas. A Realidade Aumentada é um complemento.»
É curioso que há algum tempo surgiu uma notícia sobre a escassez de cadáveres para a aprendizagem por parte de estudantes nas universidades. Essa situação fica resolvida com a Realidade Aumentada?
«Com certeza que sim. Está ultrapassada.»
A IT People tem soluções desenvolvidas há muito tempo e que ainda hoje permanecem actuais. Os seus produtos continuam a encantar os corações e as carteiras dos seus clientes e investidores. Saber aproveitar os seus recursos é um pilar fundamental na empresa e que ajuda toda esta estrutura a manter-se líder de mercado e sem perder a inovação que lhe está no nome.
Têm algum projecto do qual se orgulhem especialmente?
«Nós quando mostramos hoje o que fizemos em 2010 os nossos clientes ficam surpreendidos. Portanto nós temos de nos orgulhar de tudo o que temos feito. Eu estive no Japão no final do ano passado, na Mitsubishi, onde estive numa conferência sobre o que é que nós temos vindo a fazer e eles ficaram espantados com o que nós tínhamos para mostrar.»
Como é que conseguiram essa proeza?
«Fizemos por exemplo, entre outras, uma demonstração em que se apontava um smartphone para uma folha de papel e saía de lá um pássaro com movimento e depois havia um quiz sobre a ave. Eles ficaram admirados a olhar para a folha e a perguntar como é que aquela folha tinha ali conteúdo porque eles não conseguiam perceber. E atenção: isso era um projecto que já tinha bastantes anos! Portanto, o orgulho acaba por acontecer em tudo aquilo que nós fazemos. Conseguimos surpreender muita gente.»
Partindo daí temos de perguntar: Portugal é o caminho ou existe o objectivo de expandir além fronteiras?
«Portugal, naturalmente, será sempre o início de algo. Efectivamente, no nosso ramo, não há negócio que se concentre exclusivamente no mercado nacional. Mas o mercado nacional é sempre uma base muito interessante para testarmos os modelos.»
Os portugueses, de facto, gostam de inovação. Passa por aí?
«Sim. Nós, portugueses, felizmente temos hoje em dia muitas multinacionais a trabalhar connosco. Somos sempre um bom modelo de teste e nós somos muito receptivos a testar novas aplicações e o que fazemos a seguir é levar as aplicações lá para fora, para outros países.»
Eduardo Vieitas não se fica por Portugal e quer levar a nossa Realidade Aumentada além fronteiras. De Lisboa para o mundo é a forma de pensar deste executivo que não tem medo de arriscar em territórios geográficos e económicos mais peculiares.
Em que mercados é que a IT People anda a semear a Realidade Aumentada?
«Tenho feito várias viagens exactamente com a tal finalidade de criação de um modelo de parceria e identificação de parceiros locais, tudo para eles passarem a utilizar as nossas soluções. Aliás na altura do RALI eu não estive presente porque estava no Irão. Estamos a falar, curiosamente, de mercados como este ou até mesmo o Japão, como já referi.»
O Irão é um mercado complexo para este tipo de produtos? Há muitas sanções a atrapalhar?
«No Irão, como vocês sabem, existe uma sanção em que eles não podem utilizar soluções Microsoft. Mas a verdade é que, efectivamente, utilizam. Por isso, as sanções ultrapassam-se. Aliás, nós estamos com propostas activas neste momento, no Irão, com soluções Microsoft. Portanto, tudo é possível!»
E no que toca ao futuro. Qual é o caminho que a IT People vai seguir e quais as perspectivas para este tipo de tecnologia?
«Essa pergunta é interessante, mas é uma pergunta dificílima, é complicado fazer futurismo... Porém, se nós olharmos para os grandes players mundiais, eu diria que a Realidade Aumentada será um foco de grande investimento nos próximos 5 anos. Nós, naturalmente, como já cá estamos vamos continuar a alimentar este sector.»
Nota final sobre a nossa viagem aos bastidores da Realidade Aumentada
Após a entrevista, Luís Martins, Head of Marketing, conduziu a equipa da 4gnews, composta pelo Tiago Alves e por mim, numa visita guiada ao quartel general da IT People. Esse passeio tornou possíveis as fotografias que ilustram o presente trabalho. Entre rabiscos (verdadeiras obras primas de brainstorming) nas paredes e developers a escreverem código como quem bebe água, nada ficou de fora.
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