A Sociedade Portuguesa de Neuropediatria publicou em setembro um documento a alertar os pais e familiares sobre os danos que a utilização excessiva de ecrãs podem causar às crianças. No documento, os especialistas listam as recomendações para um uso responsável e uma relação saudável dos miúdos com os ecrãs.
"Os membros da Sociedade Portuguesa de Neuropediatria têm notado, na sua prática clínica diária, durante a última década, o impacto da utilização de ecrãs tácteis na saúde das crianças e no seu neurodesenvolvimento. Assim, procurando utilizar a evidência científica disponível, pretendem alertar os pais, educadores e sociedade civil para os riscos dos mesmos, emitindo recomendações de utilização destas tecnologias de forma mais saudável em idade pediátrica."
As recomendações dos neuropediatras sobre ecrãs na infância
Como exemplo de outras sociedades científicas que estabeleceram orientações e limites para o uso de ecrãs - como a Academia Americana de Pediatria (AAP), a Organização Mundial de Saúde (OMS), a Sociedade Canadiana de Pediatria (CPS) e o Departamento de Saúde Australiana (AHD) - a Sociedade Portuguesa de Neuropediatria estabeleceu 10 recomendações "após uma extensa revisão bibliográfica e adaptando os resultados ao contexto social e cultural nacional".
- Evitar ecrãs até aos 3 anos, exceto para videochamadas; neste contexto, exclui-se a televisão que pode ser usada até 30 minutos diários, desde que na presença de um adulto e com conteúdo adequado;
- Entre os 4 e 6 anos, limitar o uso de ecrãs a 30 minutos por dia de programação de alta qualidade, assistida na presença de adultos que ajudem a contextualizar o conteúdo; o controlo de canais/mudança de vídeos não deve ser acessível à criança de forma autónoma;
- Manter limites consistentes de utilização, dos 7 aos 11 anos até 1 hora por dia e, dos 12 aos 15 anos até 2 horas por dia, garantindo que o seu uso não interfira no sono, na interação social, na atividade física, no estudo e em outras atividades essenciais para a saúde e bem-estar;
- Como se prevê na legislação portuguesa, as redes sociais só devem permitidas a partir dos 16 anos;
- Em todas as idades, os ecrãs não devem ser utilizados como forma de facilitar as refeições, ultrapassar momentos de espera nem para controlar birras;
- Deve promover-se o uso de conteúdo educativo e de alta qualidade, utilizando estes recursos em conjunto com as crianças para ajudar a entender o que estão a ver e a aplicar o que aprenderam;
- Devem ser estabelecidos horários e áreas da casa onde o uso de dispositivos móveis não é permitido, como a mesa de refeições e os quartos;
- Os pais devem modelar comportamentos saudáveis em relação ao uso de tecnologia, demonstrando equilíbrio entre o uso de dispositivos e outras atividades;
- Incentivar atividades físicas diárias e oportunidades para interações sociais presenciais;
- Devem ser ponderadas restrições à utilização de ecrãs nos intervalos escolares, promovendo o convívio e atividade física que substituam esta utilização extensiva; igualmente, o uso de manuais digitais e de plataformas online para trabalhos de casa devem ser repensadas até ao final do terceiro ciclo, dado não existir qualquer evidência de que a sua utilização seja vantajosa para os processos de aprendizagem, sendo muitas vezes fonte de distração e dispersão para outros conteúdos não letivos.
Danos e riscos do excesso de ecrãs e da exposição precoce a eles
De acordo com o documento, evidência científica que já temos disponível hoje aponta para diferentes e preocupantes danos do uso indevido de ecrãs e tecnologia digital ao longo das várias etapas da idade pediátrica.
"Salienta-se que é particularmente nociva a exposição precoce à tecnologia digital quando os conteúdos são selecionados de forma autónoma e, muitas vezes, aleatória (ex. YouTube, TikTok, Instagram), sem interação com o adulto, sem filtros de segurança, conteúdos pouco didáticos e sem respeitar limites de tempo ajustados à idade", destaca a publicação.
Os autores da pesquisa ressaltam a importância da interação com o meio para a maturação do sistema nervoso nos bebés, e como a utilização precoce de ecrãs condiciona obstáculos como mais tempo de atividades sedentárias, dificuldade de focar a atenção e de gerir adversidades e enfrentar momentos de tédio, o que interfere com o desenvolvimento da criatividade.
A redução do tempo de interação com adultos e outras crianças, por sua vez, amplia o risco de comportamentos sociais evitáveis e atraso no desenvolvimento de linguagem e empobrecimento lexical. A qualidade do sono também pode ser fortemente afetada.
A Sociedade Portuguesa de Neuropediatria também alertou sobre os 6 grandes perigos do uso de telemóveis (e não só) em crianças.